sábado, 27 de dezembro de 2014

Embora historicamente negligenciado no Brasil, Concreto merece atenção do leitor

Concreto - Uma Rocha Entre Rochas - Devir

Ao largo do domínio da Marvel e DC na indústria dos quadrinhos no final dos anos 80, a recém-criada Dark Horse surgiu como opção a esse eixo mopolizador ao oferecer espaço para obras de grande vigor artístico. Esse vigor se deu com obras dos próprios criadores empregados pelas majors, que não encontravam nessas editoras liberdade criativa suficiente para dar vazão aos seus anseios, numa estratégia semelhante ao que faz a Image atualmente. Na época, a Dark Horse veio tentar suprir esse vácuo na indústria ao dar espaço para astros como Frank Miller, Dave Gibbons, Mike Mignola e John Bryne. 

Um dos primeiros (e um dos melhores) frutos dessa iniciativa foi Concreto, obra seminal de Paul Chadwick sobre o gentil e poderoso gigante de pedra que quer usar de sua capacidade para explorar o mundo. Inicialmente, a obra saiu em meio a consagrada antologia Dark Horse Presents e depois em revistas avulsas. Foi compilando os quatro primeiros números da publicação avulsa que em 2004 a Devir lançou Concreto - Uma Rocha Entre Rochas.

É surpreendente como a série é negligenciada pelas editoras brasileiras. O lançamento da Devir foi somente a terceira vez que a série chega ao Brasil. Antes, havia sido lançada somente uma edição pela Best News em 1990 e uma mini em três edições pela Toviassú (durante a sua breve existência). Mais recentemente, a HQM voltou com Concreto, em sua nova fase (colorida), na sua revista Dark Horse Apresenta, que apesar de irregular na periodicidade, apresenta qualidade artística e gráfica diferenciada quanto ao que ordinariamente sai nas bancas por aí.

Apesar das muitas semelhanças estéticas com os quadrinhos de super-herói, sobretudo com o personagem Coisa do Quarteto Fantático, Concreto subverte os conceitos do gênero e apresenta uma história, se não totalmente alheio a trama de ficção científica, que está muito mais preocupada em explorar as implicações filosóficas de suas aventuras. Foge, portanto, de tramas sobre aliens, guerras, política, apesar de tudo isso servir como pano de fundo.

Concreto é uma pessoa solícita, calma e caridosa, completamente ao avesso que sua aparência denota. O leitor começa a acompanhar as aventuras de Concreto sem saber sobre a sua verdadeira origem. Chadwick preferiu que primeiro o leitor se afeiçoasse ao personagem, explorando as óbvias perguntas que surgiriam sobre como aquele sujeito gentil poderia se tornar o que é, para somente depois, em flashback, contar a gênese do personagem. Ao final, a aparência de Concreto se torna o de menos, como se ela fosse abstraída frente a sua fabulosa personalidade.

Concreto - Uma Rocha Entre Rochas
Concrete #1-4
***** 9,0
Dark Horse | 1986
Conrad | 2004
Roteiro e arte: Paul Chadwick

quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

Os Melhores Quadrinhos de 2014 - Melhores capistas, edições avulsas e arcos


Chegamos à última parte da seleção dos melhores de 2014 do blog! Falaremos agora dos melhores capistas, melhores edições únicas e dos melhores arcos. 

Fazer capas de quadrinhos é uma peculiar e muito diferente de fazer as internas. O ofício exige uma especial inspiração do artista, de forma a apreender a história contada em seu interior, sem contudo revelar detalhes reveladores. A arte precisa ser reflexiva, interessante e curiosa. Quanto mais esse elementos se harmonizarem, melhor o trabalho fica. Mas alguns artistas empregam especial originalidade em suas composições, empregando em suas capas não apenas um sentido prefacial, mas também suplementar.

Melhores capistas

John Cassaday realizou isso como poucos em seu trabalho em Planetary. Todas as capas da obra são tão cheias de significado que é impensável pensar uma sem a outra. Cassaday abraçou com vigor a ideia de viagem pela cultura pop do século 20 em suas composições, ao passo que ora homenageiam os quadrinhos pulp (Doc Savage), ora as histórias de aventura do início do século 20 (Tarzan, Cavaleiro Solitário), bem como filmes de ação, ficção-científica (Matrix e 2001), e tantas outras referências que não fui capaz de identificar.

Completando o trio temos Jock, pelo seu trabalho em Escalpo (cuja publicação foi concluída esse ano pela finada mensal Vertigo), e David Aja (de Hawkeye). Ambos se valem de técnicas diferentes para composição de suas páginas, uma vez que, em razão de se tratarem de títulos bastante diferentes entre si, é evidente que enquanto um de vale de cores claras, com predominância do branco e vermelho (no caso de Aja), outro precisou criar um ambiente mais sombrio e decadente, onde se predomina a escala de cinza e vermelho. Jock foi além do óbvio em suas capas, de modo que continuamente convidava o leitor à reflexão. As capas de David Aja, por sua vez, possuem um design moderno e audacioso, coisa incomum nos quadrinhos de super-herói, em que privar as capas do personagem principal é algo impensável.






Melhores edições únicas

Acho que há pouca coisa mais revigorantes no costume de ler quadrinhos do que terminar de ler uma edição e ter vontade de dizer: "Uau, isso foi legal!". A satisfação de ler uma ótima história curta, ainda que dentro de um título regular, é maior do que ler um bom título mas que em nenhum momento empolga de verdade. Pode ser que a edição depois fique um horror, mas aquela experiência de ler algo realmente bom é insubstituível e, talvez, pode salvar toda uma série de histórias ruins.

Esse ano eu li muita coisa boa. Histórias que certamente merecem ser referenciadas, e que provavelmente foram (é só acompanhar nossos reviews). Mas dentre essas histórias, certamente, uma das que mais me marcou foi Abraço, de Neil Gaiman e Dave McKean, publicada em Hellblazer #27. Nessa história fechada - que eu li em Dias de Meia-Noite (que saiu pela Panini ano passado) mas que também consta no volume 5 de Hellblazer Origens -, Constantine se depara com a manifestação sobrenatural de uma das necessidades mais humanas que existe: o afeto. É uma das aquelas histórias que terminam com um soco no estômago do leitor. Algo como: lide com isso, agora.

No prefácio de Gaiman para a história, que está presente em Dias de Meia-Noite, ele reconhece que se trata de uma de suas obras favoritas, que ele mais tem orgulho de ter participado. Junto com a arte de McKean e as cores de Danny Vozzo (que também trabalhou em Sandman), a obra ficou definitivamente única.



Também foi destaque em 2014, não só na minha lista de leitura pelo jeito, Hawkeye #11, Pizza is my Business, que levou o Eisner de melhor edição única esse ano. Por incrível que pareça, o personagem principal não foi o Gavião Arqueiro, mas sim seu cachorro, Lucky (Sortudo), resgatado pelo herói dos maus tratos que ele sofria da máfia russa. É sempre bom quando existe uma sinergia entre roteirista e artista, de forma que ambos os fundamentos alcancem a excelência. Com Matt Franction e David Aja ocorreu assim.

Ramadã, publicada originalmente em Sandman #50, fecha essa lista. Bagdá nunca foi tão lindamente retratada na ficção como Neil Gaiman e P. Craig Russell fizeram, fazendo jus a fama de que Bagdá talvez tenha sido a cidade mais linda já construída ao longo da história. Ramadã mistura quadrinhos, literatura, história de maneira incrível. Quase não dá pra perceber as quase 50 páginas de leitura. Ao final, sobra um gosto amargo, ao refletir sobre a situação atual do Iraque.

Melhores arcos

Sim. Já está batido eleger Sandman pra tudo. Mas não há como negar que o volume 3 da edição definitiva da obra lançado pela Panini compila o ponto alto da série, que já é ótima praticamente em todas as edições. Ainda me falta concluir a obra (o volume quatro já está quase tendo a sua vez em meio a minha pilha de leitura), mas já dá pra afirmar que Vidas Breves elevou ainda mais a qualidade da série. Colocando um toque de drama familiar no relacionamento entre os Perpétuos, a série ganhou uma nova dimensão, um vasto terreno a ser explorado. Coisa que Gaiman fez muito bem. As nove edições que compões o arco (#40-49) jogam luz em diversos mistérios relacionados aos Perpétuos, sobretudo sobre Delírio, que se mostrou menos perigosa que Desejo.

Corrigan II é o arco de encerramento de Gotham City Contra o Crime. Quem achava que a saída de Ed Brubaker da série (o escritor tinha ido para a Marvel) poderia significar a derrocada da série, se enganou. Greg Rucka só não fez um encerramento à altura da qualidade de toda a série, como também soube quando parar. A DC tinha intenção na época de continua-la, mas Rucka se manteve firma a decisão de que a série acabava ali, para a sorte (ou azar) o nosso.

Até a conclusão de Até o Fim do Mundo, Preacher era uma das coisa mais legais que eu já tinha lido. Garth Ennis e Steve Dillon produziram um início de série de fôlego, de ritmo vertiginoso e de impacto. Esse arco mostra o reencontro de Jesse Custer com a sua sádica família, apresentando um dos personagens mais repulsivos da HQ, Marie L'Angelle, avó de Custer.

Preacher - Vol. 2: Até o Fim do Mundo [Panini, 2012]


Imagino como deve ter sido difícil na época do seu lançamento ler edição por edição, precisando esperar um mês para ver a continuação dos ganchos ao final. O leitor brasileiro passou por isso durante a publicação da série pela Brainstore, que ainda por cima não concluiu, interrompendo a série faltando apenas seis edições. Nós fomos ver a conclusão da série saindo por aqui somente em 2011, pela Panini.

sábado, 20 de dezembro de 2014

Primeira "Coleção Histórica" dos Vingadores traz as origens da fase 3 da Marvel nos cinemas


Sim, esse quadrinho estava à tempos na minha pilha de leitura. Mas em tempos de anúncios sobre a fase 3 da Marvel nos cinemas, foi providencial colocar a leitura da Coleção História Marvel - Os Vingadores em dia. Aproveitando todo esse hype, a Panini está publicando uma nova fase da coleção, trazendo mais histórias clássicas da equipe, dentre elas A Guerra Kree-Skrull (The Avengers #90-91; 93-97) e a A Saga de Ultron (The Avengers #127, 161-162, 170-171, 201-202 e Fantastic Four #150). Mas quero agora me referir aqui à primeira coleção lançada, em 2012.

Personagens que provavelmente darão as caras nos próximos filmes da Marvel têm suas origens contadas nas histórias desse encadernado, que abarca as edições 54 a 60 de The Avengers. Temos aqui o primeiro embate entre Capitão América (ajudado por Bucky Barnes) e o Barão Zemo, que acarretou na morte (?) do jovem sidekick; temos também a origem do vilão do próximo filme dos Vingadores: Ultron. O recorte editorial para essa coleção foi preciso, já que o arco de histórias aqui contemplado tem presença marcante dentro da cronologia da Marvel, sendo de leitura essencial para qualquer fã.

É curioso observar que a origem do robô Ultron vai ser bastante alterado em relação à versão clássica dos quadrinhos. Nas HQ's, ele é o resultado de uma das experiência de Hank Pym, o Homem-Formiga, que adquiriu vida própria e uma personalidade psicótica. Inclusive, na sequência dos acontecimentos, Ultron ainda se valeu da tecnologia de Hank para criar um de seus primeiros seguidores, o androide Visão (outro personagem confirmado para o próximo filme dos Vingadores). No filme, tudo indica que Ultron se originará de uma das tecnologias de Tony Stark.

Nas duas últimas edições, conferimos ainda a estreia do Jaqueta Amarela, que é outro personagem que vai ganhar sua versão cinematográfica, estando confirmado como o vilão do futuro filme do Homem-Formiga (a ser lançado em 2015). Ainda desconheço se nesse filme haverá alguma referência a Ultron. Mas, levando em conta o fato que a Marvel procura amarrar o máximo possível os filmes da casa, não me surpreenderia muito se Hank tenha alguma participação na criação do super-vilão.

Todas as edições são assinadas pela dobradinha Roy Thomas-John Buscema, talvez os dois nomes mais identificados com a equipe, responsável por outras clássicas aventuras entre os anos sessenta e setenta (Thomas ficou nos roteiros entre 1967 e 1972).

Coleção Histórica Marvel #4 - Os Vingadores
The Avengers #54-60
**** 7,0
Marvel | julho de 1968 a janeiro de 1969
Panini | junho de 2012
Roteiro: Roy Thomas
Arte: John Buscema
Arte-final: George Tuska e George Klein

quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Os Melhores Quadrinhos de 2014 - Roteiristas, Artistas e Coloristas

Acima: Matt Hollingsworth, Julie Maroh, Warren Ellis.
Abaixo: Dave Stewart, Art Spielgman, Neil Gaiman e
P. Craig Russell

Depois de escolher as melhores séries regulares e obras estrangeiras, vamos para outras categorias "cascudas": melhor roteirista e melhor artista. A dificuldade em escolher os melhores se agrava ao se levar em conta que tenho quase só escolhido obras renomadas e de reconhecida qualidade. Dificilmente leio uma obra sem prévia referência, e isso se deve sobretudo a falta de tempo de ler obras mais obscuras e lançamentos pouco referenciados. Mas vamos lá para as minhas escolhas, lembrando que não há classificação entre os três nomes de cada categoria.

Melhor roteirista


Fazendo dobradinha com as escolhas das melhores séries, é impossível não reconhecer o mérito de Neil Gaiman e Warren Ellis. Sandman e Planetary são seguramente uma das melhores obras dos quadrinhos. O que mais mais me surpreende nessas duas obras é o cuidado na construção das histórias, invariavelmente sempre frutos de muita pesquisa histórica e bibliográfica, sobretudo de Ellis, que em Planetary faz um verdadeira viagem dentro da cultura pop em sua obra, sem falar no embasamento científico de algumas de suas invenções.

O terceiro eleito é Art Spielgman, que rompeu várias barreira até então impostas aos quadrinhos ao lançar Maus, que conta a saga de sobrevivência de seus pais contra o regime nazista,  um marco do gênero em qualquer das acepções consideradas. Com Maus se consolidou a expansão da mídia para um público diferente, de livrarias, mais interessados em histórias adultas. Spielgman ganhou um Pulitzer pela obra, provando para muitos a relevância dos quadrinhos com um meio de expressão único. Não é pouca coisa, o que fez Maus estar indelevelmente marcado nos mais de 100 anos de história das HQ's.

Melhor artista


Curioso o papel que eu atribuo ao artista em uma HQ. Para uma HQ ser boa, é essencial que tenha uma arte também seja, e por mais que alguma obra tenha problemas de roteiros, se a arte for bacana, já não será caso de perca total. O artista deve possuir uma grande sintonia com o roteirista, para que seus desenhos componham a trama e não sejam uma mera reprodução do que tá escrito, uma mera ilustração. E nesse ponto, acho que os artistas que mais chegaram perto disso foram Juanjo Guarnido (Blacksad), P. Craig Russell (Sandman #50) e John Bolton (Os Livros da Magia #1).

P. Craig Russell
Arte de P. Craig Russell em Ramadã (Sandman #50)
Em comum também entre os três eleitos, além dos desenhos incríveis, é que todos eles provavelmente tiveram mais tempo que o artista de um título mensal, por exemplo, tem de desenhar. Suas participações foram em edições únicas, fechadas, longe da loucura do que é desenhar 20 páginas todos os meses. Talvez por isso seja um pouco injusto para os artistas dessas publicações concorrer com esse caras. Por isso, vale a pena mencionar que, dentre os títulos mensais, aqueles que saíram melhores em títulos regulares foram Michael Lark (Gotham Central), John Cassaday (Planetary) e, sobretudo, David Aja (Hawkeye).

Arte de David Aja em Hawkeye #11

Melhor colorista


Dentre os coloristas, me surpreendi com as aquarelas e guaxes de Julie Maroh em Azul é a Cor Mais Quente. Ela não só alçou a cor (no caso, azul) ao título de sua obra, como ela desempenha um papel essencial na trama, que evolui e se transforma com o transcorrer da trama, passando de tons monocromáticos no início, para o uso de variantes de azul que como se pulsassem em meio aos desenhos. Impressionante. Maiores considerações vocês podem conferir aqui. 

Os outros dois eleitos são velhos conhecidos na indústria: Dave Stewart (Fatale, Hellboy, Batman e Filho) Matt Hollingsworth (Hawkeye, Preacher e Justiceiro - Zona de Guerra). Ambos se adaptaram muito bem às técnicas modernas de colorização digital e tem usado em suas respectivas séries uma paleta de cores bastante diferenciada. Seus trabalho atualmente se caracterizam por fazer um bom uso de cores vibrantes, principalmente nas capas de Fatale e Hawkeye, obras que os credenciaram a encabeçar a minha lista de melhores. 

sábado, 13 de dezembro de 2014

Millar e McNiven oferece "quadrinho pipoca" competente e violento


Fugindo uma da toada de reedições de arcos há pouco tempo publicados no Brasil, a Salvat finalmente começou a lançar alguns materiais, que não são inéditos, pelo menos nunca tinham sido lançados em sua forma encadernada. Wolverine - O Velho Logan é uma dessas obras. Antes, ela só tinha saído em meio às revistas mensais do Wolverine em 2009. Coube a Salvat quebrar essa pasmaceira da Panini e relança-la.

A premissa não poderia ser menos interessante: como seria o mundo em que os super-vilões venceram e assumiram o poder? Mais ainda: um mundo em que praticamente todos os super-heróis estão mortos? Mark Millar pensou nesse mundo, fazendo jus a sua fama em começar muito bem suas histórias. O problema dele sempre foi com os finais.

Wolverine é um dos poucos heróis sobrevivente desse cenário distópico, muito mais devido ao seu obstinado fator de cura do que por vontade própria. Logan está fadado a viver. Millar e McNiven ignoram qualquer limitação etária para a revista e nos brinda com uma história violentíssima, de forma como nunca li na Marvel, mesmo dentro do selo MAX ou Marvel Knights, tradicionalmente compostos por histórias mais fortes. McNiven possui uma arte que pende mais pro realismo do que, por exemplo, Steve Dillon (que também pesou a mão no sangue em sua passagem por Justiceiro).

O resultado é uma história de ação constante, da forma como convencionei a chamar de "quadrinho pipoca". Se não fosse suficiente haver diversas cenas de luta corpo-a-corpo, tiroteios e muito sangue rolando, a série ainda oferece uma perseguição insana de dinossauros! O título, por essas e outras, é muito divertido e quase não se nota a leitura de suas mais de 200 páginas.

Claro que não é quintessência da arte sequencial. É apenas uma aventura descompromissada, chocante e bastante fiel à história do Wolverine, muito embora tenha praticamente implodido do todo o universo Marvel, ao impor a derrocada do heroísmo. No final, ainda fica aquele gancho pra uma possível continuação, que ainda não veio. Ainda não é sem tempo.

Wolverine - O Velho Logan
Wolverine (Vol. 3) #66-72 e Giant-Size Old Man Logan
**** 7,5
Marvel | 2008 e 2009
Salvat | setembro de 2014
Roteiro: Mark Millar
Arte: Steve McNiven
Arte-final: Dexter Vines, Mark Morales e Jay Leisten

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Os melhores quadrinhos de 2014 - Série regular e Obra estrangeira

Inicialmente devo advertir o leitor que esse artigo tem como critério único e exclusivo o meu gosto pessoal e não se refere necessariamente à quadrinhos publicados somente em 2014. O único requisito é que eu tenha botado os olhos na HQ ao longo desse ano que está terminando. Ou seja, pode acontecer que obras do arco da velha deem as caras por aqui. Também não irei cravar um vencedor, nem uma ordem de classificação, apenas elencarei os três destaque em cada categoria. Essa coluna demoraria o triplo de tempo para ser escrito se eu tivesse que decidir (sim, sou um poço de indecisão).

Esse foi um ano especialmente bom para o mercado de quadrinhos no Brasil. Obras de todos os gostos ganharam as estantes das bancas e livrarias, de todos os gêneros e procedências, material inédito ou republicações. Trata-se de uma época incrível para se ler quadrinhos e aparentemente essa tendência tem tudo para continuar em 2015.

Então, sem mais delongas, vamos para a listinha de fim de ano, que será dividida em três partes.

Melhor série regular


Essa foi uma categoria especialmente difícil de me decidir, pois as melhores e mais consagradas e obras de hoje e de antigamente desembarcaram aqui no Brasil nos últimos tempos, vide o ótimo trabalho de editoras como a Nemo, Vertigo/Panini e Companhia das Letras. É bom que eu também deixe claro aqui que várias dessas obras renomadas que saíram por aqui, como Monstro do Pântano e Sandman Teatro do Mistério, que ainda não cheguei a ler. Provavelmente farão parte da lista do ano de que vem.

Mas vamos as melhores séries. Primeiramente vou falar de Gotham City Contra o Crime (Gotham Central) que, além de ter sido umas melhores coisas que eu já li nos quadrinhos nos últimos tempos, é umas das maiores surpresas também. Quem diria que uma série ambientada em Gotham praticamente sem participação do Batman seria tão boa? Tudo graças ao talento de Ed Brubaker, Greg Rucka e Michael Lark em desenvolver tramas policiais. Uma equipe artística impecável e que ofereceu tudo aquilo que eu espero num quadrinho: diversão e reflexão. Confira os reviews de Gotham Central aquiaqui aqui

gotham central

As próximas duas eleitas são marmeladas. Planetary e Sandman são as obras máximas de dois gênios das HQ's, Warren Ellis e Neil Gaiman, respectivamente. Planetary ganhou uma publicação relâmpago digna de elogios pela Panini entre 2013 e 2014, apresentando os arqueólogos do impossível a toda uma geração de novos leitores. Uma obra para se ler sempre e imoderadamente. As camadas de leitura daquilo são quase inesgotáveis.

Sandman entrou entre as minhas preferidas principalmente graças ao arco Vidas Breves (Sandman #41-49), que até agora é a meu preferido na série. O volume 3 da edição definitiva da série lançado pela Panini ainda traz Ramadã (Sandman #50), outra preciosidade da nona arte, ilustrado por P. Craig Russell, que traz uma versão ainda mais fantástica das Mil e Uma Noites. Coisa maravilhosa.

Melhor série/obra estrangeira


Como a maioria das minha leituras (e das publicações das editoras brasileiras) se concentraram em títulos americanos, achei apropriado criar essa categoria em que se concentra as obras europeias, japonesas, brasileiras etc. E nesse filão teve destaque Blacksad: Vol. 3 - Âme Rouge, Azul é a Cor Mais Quente e J. Kendall. Reconheço que fiquei devendo em leitura de material nacional, apesar de muito material de qualidade ter saído.

Blacksad pode ser genericamente definida como uma série policial noir passada por volta da década de 50, que até agora acumula 5 livros. No Brasil, deu as caras por aqui apenas os dois primeiros, lançados pela Panini em 2006. Âme Rouge (Amor Vermelho, em tradução livre) é o livro seguinte, que não chegou por aqui. É uma pena, pois Canáles e Guarnido melhoram a cada obra e não economizam no apuro técnico, tanto que eles são famosos pelo longo tempo que demoram para concluir seus trabalhos. O review completo de Âme Rouge você pode conferir aqui.

blacksad


Pra mim, Azul é a Cor Mais Quente é a prova de que nada ainda substituiu a experiência de frequentar uma livraria/banca física. É uma das melhores formas de se conhecer obras desconhecidas ou que não estavam na nossa lista de compra. Com Azul... aconteceu isso. Depois que eu dei uma folheada na obra, não tive dúvidas: aquilo era ouro puro. E não me arrependi da compra. Trata-se de uma história incrível, acompanhado de uma bela e sensível performance artística de Julie Maroh. Também fiz um review sobre a obra.

azul é a cor mais quente martins fontes


Depois de duas obras francesas, é uma italiana que fecha a lista: J. Kendall. Apesar de ser uma obra seriada, de muitos números, J. Kendall tinha tudo para espanar nos números mais avançados, acontecendo o comum esgotamento da criatividade e originalidade. Mas Giancarlo Berardi é um dos gênios dos quadrinhos italiano (também festejado por criar o personagem Ken Parker) e, sempre cercado de bons colaboradores, não deixou a peteca da série cair, muito embora haja os compreensíveis altos e baixo. No Brasil, J. Kendall é publicado pela Mythos e você pode conferir um review aqui.

Confira também:
- Melhores capistas, edições avulsas e arcos

sábado, 6 de dezembro de 2014

Final de Planetary explora ainda mais a relação entre ficção e realidade, entre meio e mensagem

Planetary volume 4, arqueologia espaço-temporal, panini

É admirável que Warren Ellis não tenha se preocupado nenhum pouco em deixar o final de Planetary mais palatável ao leitor. Fiel ao estilo que seguiu durante toda a série, o volume final da série amarra todas as tramas apresentadas até aqui e harmoniza todas elas. Até pontos que aparentavam esquecidos, voltam com força no final, como a ideia por trás das 196.833 dimensões que dá a forma de um floco de neve à realidade. O último número (#27), em particular, é de uma piração total. Não foi a toa que Ellis e Cassaday demoraram três anos para concluí-lo.

A teoria de que o universo é composto essencialmente de informação e de que ele seja estruturado somente em duas dimensões é também outro criativa ideia metalinguística de Ellis ao se referir exatamente ao universo ficcional, inclusive os quadrinhos. Afinal, não são os quadrinhos, assim como o cinema e a TV, fonte de universos ficcionais em duas dimensões? Universo esse percebido em 3D graças a perspectiva do leitor? Toda essa realidade alternativa, no caso das HQ's, está toda expressa nas duas dimensões de uma imagem em meio à uma pilha multidimensional (que é a revista em quadrinho concretamente).

Até o nome dado ao encadernado revela essa metalinguagem. A arqueologia espaço-temporal se refere a uma das bases sobre a qual se sustenta a teoria da narrativa gráfica. O que são os quadrinhos a não ser o espaço (o dos quadros) convertido em tempo? Toda essa teoria do espaço como forma de expressar o tempo nas HQ's foi muito bem explicada por Will Eisner em Narrativas Gráficas e, posteriormente, por Scott McCloud em Desvendando os Quadrinhos.

Não parecia à primeira vista, mas por baixo dessas toneladas de referências havia uma trama maior, unificadora das demais. Planetary apresenta diversas camadas de entendimento a depender da bagagem cultural do leitor. Muitos irão ler sobre o duelo entre a fundação Planetary e os Quatro. Outros vão, além disso, enxergar uma crítica à própria indústria dos quadrinhos. Aliás, é famosa a teoria de que os Quatro seriam, na verdade, uma metáfora para a deterioração que os quadrinhos passaram desde o advento dos Quarteto-Fantástico em 1964.

Por fim, vale mencionar o quanto John Cassaday subiu em meu conceito como artista. Ele teve aqui oportunidade de apresentar toda a sua versatilidade, muito além do que os quadrinhos em geral exigem de algum profissional. O trabalho feito nas capas é um dos melhores já feitos, sobrepujando, em minha concepção, qualquer outro trabalho do gênero. Pois elas integram a história a HQ, o que justifica a opção da Panini em colocá-las antes da respectiva história.

Planetary: Volume 4 - Arqueologia Espaço-Temporal
Planetary #19-27
***** 9,0
Wildstorm | 2004, 2005, 2006 e 2009
Panini | abril de 2014
Roteiro: Warren Ellis
Arte: John Cassaday
Cores: Laura Depuy