sexta-feira, 18 de março de 2016

"A Máquina de Goldberg" retrata drama do bullying na adolescência


Sabe aquelas geringonças mirabolantes construídas para realizar um simples ato, passando por uma infinidade de estágios conectados entre si, podendo incluir desde um gato se espreguiçando até o acionamento de uma ampulheta? Então, esse sistema é conhecido como máquina de Goldberg e é de importância central para o quadrinho de mesmo nome escrito pela jornalista Vanessa Barbara e pelo ilustrador Fido Nesti.

A obra conta o típico drama de um adolescente que sofre bullying. O alvo das gozações é Getúlio, que parece incorporar todas aquelas clássicas característica de um garoto impopular. O seu suplício aumenta quando ele e sua turma de colégio vão passar uma temporada num acampamento de verão, ironicamente chamado de "Montanha Feliz". Lá ele é posto em várias situações constrangedoras que agravam sua situação. 

Foi com o zelador do acampamento que Getúlio conhece os aparatos que dão nome ao álbum. Para que simplificar uma ação se podemos complicá-la? O singelo ato de fechar uma porta se transforma em um processo de 17 estágios, que inclui um fole-assoprador inflando uma bexiga, fazendo que a bola que se repousava sobre ela seja lançado sobre uma canaleta... e assim vai, até a porta ser finalmente fechada. Quanto mais complexo e demorado for a sequência de atos, maior a façanha de seu criador. 

Essa peculiar forma de fazer as coisas foi uma criação do engenheiro e artista-plástico Rube Goldberg. Mais do que construir tais geringonças, Goldberg criou uma filosofia de vida. Uma vingança bem aplicada é aquela melhor elaborada, minuciosamente construída de maneira do resultado ser inevitável. Vemos claramente isso dentro da trama. Getúlio não verá tais máquinas como um mero escapismo para a perseguição que sofre, mas como uma ferramenta para combatê-la, uma esperança. 

Vanessa Barbara é uma proeminente escritora brasileira que já lançou alguns livros muito interessantes, como O Livro Amarelo do Terminal (seu primeiro grande trabalho, que lhe rendeu o Prêmio Jabuti de Reportagem), além de ser colunista da Estado de S. Paulo. Particularmente, sou muito fã do seu estilo de escrita. Seus textos quase sempre revelam o seu grande poder de observação, e ela sempre procura lançar uma visão curiosa do fenômeno retratado. Também vemos isso muito bem ao longo da trama. 

Fido Nesti divide a autoria da obra com Vanessa e é o responsável pela arte do álbum. Seus trabalhos incluem ilustrações para diversos veículos de comunicação brasileiros e estrangeiros e para obras como Lusíadas em quadrinhos (Peirópolis, 2006) e Loucas de Amor em quadrinhos (Ideias a Granel, 2009). 

Na presente obra, apesar dos desenhos estarem bem bacanas, não gostei do tom monocromático (levemente esverdeado). Além disso, creio que a opção de contar a história por meio de quadros menores, simetricamente divididos, fazendo pouco uso de tomadas panorâmicas, tenha deixado o ritmo de leitura pouco dinâmico. Talvez a limitação no número de páginas justifique o modelo adotado. Todavia, não se trata de algo que especialmente comprometa a obra.

Artigo originalmente publicado no Pipoca e Nanquim

A Máquina de Goldberg
*** 6,0
Quadrinhos na Cia. | novembro de 2012
Roteiro: Vanessa Barbara
Arte: Fido Nesti

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