Após concluir o ótimo Sweeth Tooth no início de 2013, Jeff Lemire logo emplacou outro trabalho no selo Vertigo. Dessa vez em um projeto totalmente diferente da obra que o precedeu. Enquadrar Trillium como uma epopeia espacial é mostrar apenas um prisma da obra, pois Lemire desceu muito a fundo nos conceitos clássicos de ficção científica, conseguindo resultados muito interessantes, sobretudo se considerarmos que se trata de uma minissérie de apenas oito edições.
Trillium acompanha a história de duas pessoas, Nika e William, separados temporalmente por mais de dois milênios de história, mas misteriosamente ligados por algum vínculo cósmico. Nika é um dos poucos sobreviventes da raça humana em 3797, que vem sendo perseguida por vírus mortal com potencial para dizimar o restante da humanidade. A última esperança se encontra no potencial curativo de uma planta chamada Trillium, somente encontrada aos pés de uma pirâmide ocupada por uma isolada tribo. Por outro lado, William é um explorador do ano de 1921, que procura na floresta amazônica peruana um mitológico templo Inca.
Enquanto Nika tentava estabelecer contato com a tribo, ela é provocada pelos nativos a ingerir o Trillium e entrar no templo, fato que a mandou de volta no tempo, direto para o templo Inca na Amazônia em 1921, dando de cara com William. A partir desse momento, o destino deles irremediavelmente se unem, ao passo que as ações de um passam a provocar consequências no outro.
O entrelaçamento entre os destinos de Nika e William não ficou apenas no aspecto do conteúdo. Jeff Lemire, flertando com o experimentalismo, trabalhou também a forma, de modo que os quadros e as páginas refletem esse aspecto do enredo. A primeira edição, por exemplo, é um flipbook que possui duas capas (uma com Nika em destaque; outra, com William). O leitor pode começar a ler a história por qualquer sentido, sem prejuízo de entendimento.
Na terceira edição, as páginas que conta a história de Nika estão no sentido comum, enquanto as de William ficam de ponta-cabeça, precisando o leitor virar o livro para continuar lendo. Na quinta edição, a parte de cima da página conta a história de Nika, a metade de baixo, de ponta-cabeça, a de William. Toda essa inusitada disposição dos quadros vem enriquecer ainda mais um roteiro já bastante experimental. Não é propriamente uma técnica original conduzir o leitor a uma imersão na forma (Monstro do Pântano de Alan Moore está aí pra demonstrar), mas é alvissareiro perceber que ainda há autores dispostos a experimentar dentro dos quadrinhos mainstream.
Nesse ponto da carreira, Jeff Lemire demonstra não só sua versatilidade nos desenhos (todos lindos), como a sua disposição em experimentar. Em muitos momentos, Trillium apresenta uma trama hermética, de difícil assimilação. Contudo, se o leitor se permitir abstrair alguns conceitos e embarcar na proposta de Lemire, a viagem terá tudo para ser gratificante ao final.
Trillium
Trillium #1-8
**** 8,0
Vertigo | outubro de 2013 a junho de 2014
Roteiro e Arte: Jeff Lemire
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