domingo, 10 de maio de 2015

"Saga" mantém a fluidez narrativa sem comprometer o conteúdo


É uma característica que sempre acompanhou Saga, mas que só agora, lendo o volume 4, eu reparei: a peculiar relação tempo-espaço por quadrinho. A composição de página de Fiona Staples desde o início da série é de economia de quadrinhos. Eles são geralmente compostos por painéis na horizontal (emulando o widescreen do cinema) e splashe-pages (em média de 3 por edição), ou seja, são poucos quadrinhos para contar uma história contínua que se desenrola durante um grande período de tempo. Isso significa que a sarjeta entre um quadrinho e outro tende a serem gigantes.

Para quem ainda não teve oportunidade de ler o clássico Desvendando os Quadrinhos (se você for um desses, não sabe o que está perdendo), Scott McCloud apresenta uma explanação bastante didática sobre o que seria a sarjeta nos quadrinhos: o espaço existente entre um quadrinho e outro, onde a imaginação do leitor é especialmente exigida para uni-los em torno de uma ideia, um significado. Em Saga, viagens interplanetárias são feitas no espaço de uma página, grandes acontecimentos se dão em poucos números. Ao contrário de muitas obras, principalmente séries regulares, que demoram meses para se chegar ao clímax, Saga é extremamente enxuta em sua estrutura, o que permite Fiona Staples a melhorar sua arte.

Trata-se de uma qualidade a ser creditada tanto a Brian K. Vaughan quanto a Staples, que conseguem dizer mais com menos, sem comprometer o envolvimento do leitor com a trama ou com os personagens. Personagens esses que continuam incríveis como sempre foram. Eu desconheço onde começa e até onde vai a contribuição de Vaughan e Staples no desing dos personagens, que são de uma inventividade incomum. Nem toda Tropa dos Lanternas Verdes apresenta tamanha diversidade como a encontrada no universo de Saga. Claro que a aparência deles guardam, ainda que ligeiramente, alguma relação com sua respectiva personalidade, vide Yuna, a traficante de drogas do novo trabalho de Alana.

No volume 4, finalmente a família encabeçada por Alana e Marko conhecem algum período de calmaria, bem longe dos seus habituais algozes. Porém, coincidência ou não, uma crise conjugal se instala, sobretudo em razão do vício em alucinógenos de Alana e da nova amiga de Marko, que está dando em cima dele. Além disso, trabalhando em período quase integral, Alana passa a ficar sem tempo para o marida e filha. Isso tudo mostra que não importa o quão improvável é o universo de Saga, a HQ ainda consegue se comunicar com o leitor através de dilemas e problemas bastante ordinários.

Sem dúvida, Saga continua seguindo um ótimo ritmo e apresentando uma grande história, que tem tudo para ficar marcada na história dos quadrinhos. A história me lembra um pouco de Y - O Último Homem, também de Vaughan. Enquanto nesta série, Yorick percorria o país atrás atrás da cura para a doença que dizimou todos os outros homens do mundo (numa espécie de road movie apocalíptico), Saga segue dinâmica semelhante, ao submeter Alana, Marko e cia. a uma, com o perdão da redundância, saga cósmica de tirar o fôlego. Taí também o porquê de eu levar tanta fé no crescimento da história.

Saga - Volume 4
Saga #19-24
**** 8,5
Image | dezembro de 2014
Roteiro: Brian K. Vaughan
Arte: Fiona Staples

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