É admirável que Warren Ellis não tenha se preocupado nenhum pouco em deixar o final de Planetary mais palatável ao leitor. Fiel ao estilo que seguiu durante toda a série, o volume final da série amarra todas as tramas apresentadas até aqui e harmoniza todas elas. Até pontos que aparentavam esquecidos, voltam com força no final, como a ideia por trás das 196.833 dimensões que dá a forma de um floco de neve à realidade. O último número (#27), em particular, é de uma piração total. Não foi a toa que Ellis e Cassaday demoraram três anos para concluí-lo.
A teoria de que o universo é composto essencialmente de informação e de que ele seja estruturado somente em duas dimensões é também outro criativa ideia metalinguística de Ellis ao se referir exatamente ao universo ficcional, inclusive os quadrinhos. Afinal, não são os quadrinhos, assim como o cinema e a TV, fonte de universos ficcionais em duas dimensões? Universo esse percebido em 3D graças a perspectiva do leitor? Toda essa realidade alternativa, no caso das HQ's, está toda expressa nas duas dimensões de uma imagem em meio à uma pilha multidimensional (que é a revista em quadrinho concretamente).
Até o nome dado ao encadernado revela essa metalinguagem. A arqueologia espaço-temporal se refere a uma das bases sobre a qual se sustenta a teoria da narrativa gráfica. O que são os quadrinhos a não ser o espaço (o dos quadros) convertido em tempo? Toda essa teoria do espaço como forma de expressar o tempo nas HQ's foi muito bem explicada por Will Eisner em Narrativas Gráficas e, posteriormente, por Scott McCloud em Desvendando os Quadrinhos.
Não parecia à primeira vista, mas por baixo dessas toneladas de referências havia uma trama maior, unificadora das demais. Planetary apresenta diversas camadas de entendimento a depender da bagagem cultural do leitor. Muitos irão ler sobre o duelo entre a fundação Planetary e os Quatro. Outros vão, além disso, enxergar uma crítica à própria indústria dos quadrinhos. Aliás, é famosa a teoria de que os Quatro seriam, na verdade, uma metáfora para a deterioração que os quadrinhos passaram desde o advento dos Quarteto-Fantástico em 1964.
Por fim, vale mencionar o quanto John Cassaday subiu em meu conceito como artista. Ele teve aqui oportunidade de apresentar toda a sua versatilidade, muito além do que os quadrinhos em geral exigem de algum profissional. O trabalho feito nas capas é um dos melhores já feitos, sobrepujando, em minha concepção, qualquer outro trabalho do gênero. Pois elas integram a história a HQ, o que justifica a opção da Panini em colocá-las antes da respectiva história.
Planetary: Volume 4 - Arqueologia Espaço-Temporal
Planetary #19-27
***** 9,0
Wildstorm | 2004, 2005, 2006 e 2009
Panini | abril de 2014
Roteiro: Warren Ellis
Arte: John Cassaday
Cores: Laura Depuy
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